O coroinha vítima de ao menos dez estupros cometidos pelo padre condenado a 26 anos e oito meses de prisão na sexta-feira (22), em Penápolis (SP), fez a denúncia após ouvir uma declaração do papa Francisco sobre abusos na Igreja Católica, conforme consta no processo judicial. O padre, que negou os crimes, vai poder recorrer em liberdade.
Segundo apurado pela TV TEM, a denúncia chegou ao conhecimento da Justiça de Penápolis em 2024. Em 27 de novembro do ano passado, o papa Francisco havia afirmado que a Igreja Católica deve buscar o "perdão" pelo "flagelo" dos abusos sexuais de menores de idade, em um discurso na Bélgica.
À época, o coroinha afirmou à Justiça que, além de ouvir as declarações do pontífice, tinha lido uma nota na qual Francisco declarava que a Igreja deveria se responsabilizar pelos abusos contra crianças e adolescentes.
Diante disso, ele decidiu ir até a Diocese de Lins (SP) para denunciar o crime. Ainda conforme o processo, à época, a diocese informou que não poderia tomar providências sem provas contra o padre Antônio de Souza Carvalho.
A vítima também detalhou que os primeiros abusos ocorreram dentro do carro do sacerdote. Ao passar pela situação, disse que chegou a pensar: "Por que ele está fazendo isso?".
Relatou ainda que não tinha reação para pedir que o padre parasse, além de ter medo, pois Antônio era rígido e bravo. Conforme o documento, o coroinha via o padre como um servo e representante de Jesus Cristo.
Condenação
Segundo a sentença, os crimes começaram em 2009, quando a vítima tinha 13 anos, e duraram até 2014. A decisão foi proferida pelo juiz Vinicius Gonçalves Porto na sexta-feira (22).
Conforme a sentença, o sacerdote iniciou os abusos após a vítima se mudar da zona rural para a área urbana de Penápolis e passar a frequentar a Paróquia Sagrada Família, localizada no bairro Eldorado, junto à família.
Com o tempo, o menor passou a atuar como coroinha da igreja, quando começou a ser abusado pelo padre no carro durante os trajetos até as missas. Durante o percurso, o padre passava as mãos nas pernas e nas partes íntimas do adolescente, além de dar beijos em seu pescoço, segundo a sentença.
Em uma das situações narradas pela vítima, o adolescente viajou com o padre para Limeira (SP), onde ambos dormiram no mesmo quarto e o padre novamente abusou dele.
Conforme relatos durante o processo, a vítima contou que não denunciava as agressões porque via o padre como "um deus". No entanto, passou a demonstrar comportamentos agressivos em casa e só revelou os abusos à Igreja após completar a maioridade. A vítima só denunciou o caso às autoridades na semana passada.
A produção da TV TEM apurou que o padre está afastado das funções como sacerdote e que está morando atualmente em Lins, mas que ainda continua sendo padre.
Padre nega crime
Durante o processo, o padre Antônio de Souza Carvalho negou os crimes e disse que eram demonstrações de "carinho".
O g1 tentou contato com a defesa do sacerdote após a condenação, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
O que diz a diocese
Em nota, a Diocese de Lins, responsável pela paróquia em Penápolis, confirmou que teve conhecimento da condenação em primeira instância e informou que o caso foi comunicado ao Dicastério para a Doutrina da Fé, em Roma, que determinou a instauração de um Processo Penal Administrativo, ainda em curso.
"Como Pastor desta Igreja Particular, manifesto profunda dor diante desse acontecimento, reafirmando nosso compromisso com a verdade, a justiça e o cuidado com todos os envolvidos", escreveu em nota o bispo da Diocese de Lins, Dom João Gilberto de Moura.